domingo, 25 de julho de 2010

'LACRIMAE RERUM'


Ouço-as gemer em convulsões estranhas
As árvores senis; choram os ventos,
Corre o pranto dos rios alvacentos
Pelas rugosas faces das montanhas.

O mar, fervendo em mal contidas sanhas,
Povoa o ar de queixas e lamentos;
Pelos vulcões, em vômitos sangrentos,
Expele a terra as cálidas entranhas.

No ocaso expira o sol todos os dias,
E se veste de luto pelo morto
O lago, o bosque, o vale, as serranias.

E à noite vem, com toda a mágoa sua,
Sobre as mágoas da terra sem conforto,
Velar, chorando, a compassiva lua.

Pe. Antônio Tomaz

'CONTRASTE'


Quando partimos no verdor dos anos,
Da vida pela estrada florescente,
As esperanças vão conosco à frente,
E vão ficando atrás os desenganos.

Rindo e cantando, céleres e ufanos,
Vamos marchando descuidosamente...
Eis que chega a velhice de repente,
Desfazendo ilusões, matando enganos.

Então nós enxergamos claramente
Como a existência é rápida e falaz,
E vemos que sucede exatamente

O contrário dos tempos de rapaz:
– Os desenganos vão conosco à frente
E as esperanças vão ficando atrás.

Pe. Antônio Tomaz

'IN TENEBRIS'


Eram-me as ilusões da mocidade,
Constelações de magna refulgência,
Que o céu da minha plácida existência
Vinham doirar de branda alacridade.

Apagou-as o tempo sem piedade,
Uma após outra, com brutal violência,
Deixando-me sem luz, sob a influência
Dos desenganos da senilidade.

Vejo agora, repleto de amargura,
Mudada em penas, a fugaz ventura
Desses momentos calmos e risonhos,

E para sempre extinta nas sombrias
E longas noites dos meus negros dias,
A via-láctea branca dos meus sonhos.

Pe. Antônio Tomaz

'DESENGANOS'


Muitas vezes sonhei nos tempos idos
Acalentando sonhos de ventura,
Então a voz da lira suave e pura
Era-me um gozo d'alma e dos sentidos.

Hoje, vejo meus sonhos convertidos
Num acervo de dores e de amargura
E percorro da vida a estrada escura
Recalcando no peito os meus gemidos

E se tento cantar como remédio
Minhas mágoas ao sombrio tédio
Que lentamente as forças me quebranta

Os sons que ira que arranco agora
Mais parecem soluços de quem chora
Do que a doce toada de quem canta.


Pe. Antônio Tomaz

"CONFIDÊNCIAS"


Eu fui contar, chorando, as minhas penas
Ao velho mar; e as ondas buliçosas,
Julgando que eu diria essas pequenas
Mágoas comuns ou queixas amorosas,

Não quiseram cessar as cantilenas
Que entoavam nas praias arenosas;
Mas, pouco a pouco, imóveis e serenas,
Quedaram todas, por me ouvir ansiosas.

E concluída a narração de tudo,
Mostrou-se o mar ( pois nunca tinha ouvido
História igual ) sombrio e carrancudo.

Depois, rolando as gemedoras águas,
Pôs-se a chorar também compadecido
Das minhas fundas, dolorosas mágoas.


* Antônio Thomaz


*Padre Antônio Thomaz nasceu no dia 14 de setembro de 1868, em Acaraú (Sergipe)
Em Sobral estudou as primeiras letras, latim e francês, entrando para o Seminário de Fortaleza, onde se ordena em 1891.Tendo feito voto de pobreza, Antônio Thomaz passou praticamente toda a sua vida em paróquias do interior, levando vida modesta e apagada, dedicado à missão, escrevendo versos e cuidando dos passarinhos.Após o apostolado, não tanto anônimo por causa do ser poeta, Antônio Thomaz vai morar em Santana. A saúde anda precária e se muda para Sobral e, no fim da vida, para Fortaleza, onde morre no dia 16 de julho de 1941.

domingo, 18 de julho de 2010

Soneto


Santa amizade, que habitar imitas
neste baixo, fingido, e térreo assento,
mas que tens por morada o firmamento
com as essências angélicas benditas.

De lá, por dó das térreas desditas
sonhos nos dás de alegre fingimento,
imitações do céu por um momento,
fugaz consolo as regiões proscritas.

Volta, volta dos céus, pura amizade,
ou proíbe que a amável aparência
te usurpe a desleal perversidade.

Confundida ecoa nobre e infame essência,
breve reverte o mundo á prisca idade;
volve o caos, é morta a Providência.

Miguel de Cervantes

terça-feira, 13 de julho de 2010

'SALMO DO INSTANTE IV'


Momento, cor sem essência ,
resumido em larga dispersão.
Sobra de outros sonhos
impossíveis à nossa lentidão.

Fulcro da vida, ergue-se no espaço
desatinado. Logo mais declina
em profundo arquejo de cansaço.

Momento, um leve rastro apenas
desse lampejo cósmico pertinaz
que é o tempo em plena floração.


Yttérbio Homem de Siqueira
em Abismo Intacto -1.983

*Yttérbio Homem de Siqueira Cavalcanti
Nascimento= 28 de fevereiro de 1.932 em Natal, Rio Grande do Norte
mas sua formação cultural é nitidamente pernambucana, para onde se muda em 1947 para cursar o colegial, depois os de Direito e de História.
Morte-5 de novembro de l.981 em Brasília.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

O tempo parou


O tempo parou. Nada se move.
O vento grita como louco,
Mas tudo permanece no mesmo lugar.
As águas correm, mas são sempre as mesmas.

São os mesmos bezerros, as mesmas vacas,
O mesmo pasto verde, os coqueiros,
As paineiras, a cerca de arame farpado.
A terra não mudou neste lugar.

O sol nasce e morre no horizonte.
O galo canta com um anzol no bico.
Os pássaros e os peixes cantam.

As sementes morrem e nascem.
A figueira renasce, resiste.
O tempo não existe no paraíso.

José Carlos Brandão
*Nota do autor:
Este poema é do Vasqs. A ideia é dele, eu só escrevi.
Ele disse sentir-se lisonjeado e que me fez voltar à
metafísica – mas eu nunca saí, a metafísica está nas coisas
mais simples. É só extasiarmo-nos com a beleza – e estamos
fazendo metafísica.

sábado, 3 de julho de 2010

(Walk to Caesaria)

"My God, My God
May these never end...
The sand and the sea
The rustle of the waters
The lightning of the heavens,
The prayer of man."

Hannah Senesh


אלי, אלי

אלוהים, אלוהים
אלה מעולם לא סוף מאי ...
את החול והים
את רשרוש של המים
את בזק של השמים,
התפילה של האיש

חנה סנש